A pandemia da Covid-19 veio evidenciar ainda mais as desigualdades sociais e em saúde que existem na nossa sociedade.
A batalha é comum: conseguir quebrar as cadeias de transmissão e reduzir os impactos nos serviços de saúde, na economia e na sociedade. Porém, o acesso à saúde e as condições laborais variam consoante os grupos.
Em Portugal existe uma grande heterogeneidade nas populações migrantes, quer em termos de origem, situação socioeconómica, quer em acesso aos serviços de saúde e sociais. Para estas pessoas que de uma forma geral têm empregos onde há contato com o público ou grupos de risco (empregados de limpeza, cabeleireiros, funcionários de lares, construção civil etc) acresce ainda a necessidade do uso de transporte públicos, sendo o risco de infeção muito maior.
A situação não é muito diferente em outros países. Michelle Bachelet, Alta Comissária dos Direitos Humanos da ONU, afirmou que descendentes de africanos e outras minorias étnicas sofrem mais com a pandemia em países como Brasil, França, Reino Unido e Estados Unidos devido à sua situação socioeconómica.
No Estado de São Paulo, as estatísticas apontam para que os negros tenham mais 62% de chance de morrer de Covid 19 do que pessoas de cor branca. No Rio de Janeiro, as populações das favelas denunciam falta de água e sabão, medida preventiva básica à qual não têm acesso. Em finais de maio, havia 15 estados brasileiros que tinham menos mortes do que aquelas ocorridas nas favelas cariocas. Os números da Covid-19 em todo o estado do Rio de Janeiro são igualmente expressivos quando comparados com dados da criminalidade. Em apenas dois dias, o estado registrou mais mortes pela doença do que o número de assassinatos de qualquer mês de 2020.
Atualmente (dia 17 de julho) no Rio de Janeiro, segundo a plataforma “Painel Unificador COVID-19 Nas Favelas do Rio de Janeiro” ocorreram 751 óbitos e 5410 casos confirmados apenas nas favelas cariocas.
O Brasil é o segundo país com maior número de infeções e óbitos, sendo preocupante a desigualdade social existente que aumentará com as consequências da crise económica e o descrédito feito pelo presidente Jair Bolsonaro quanto à doença.
Nos Estados Unidos, o país mais afetado pela pandemia, a taxa de morte de afro-americanos é mais que o dobro da de outros grupos étnicos. É o caso da área metropolitana de Milwaukee, em Wisconsin que no começo de Abril, em 49 mortes tinha 72% que eram de cidadãos negros mesmo que a população afro-americana fosse de 26%. Para os especialistas, esta disparidade nos números é fruto de desigualdades estruturais que fazem com que comunidades negras no país fiquem mais suscetíveis ao contágio e tenham mais chances de desenvolver formas graves da covid 19. Muitos americanos negros não têm acesso ao plano de saúde, acrescendo ainda mais o risco numa situação de emergência como esta. Nos EUA, ainda não há números oficiais relativos ao país inteiro, uma vez que muitos Estados e cidades não divulgam a etnia dos pacientes infetados ou que faleceram com o vírus.
No Reino Unido, há já estudos que comprovam que pessoas de minorias étnicas morreram em maior número do que compatriotas brancos. A Direção Geral da Saúde de Inglaterra reconheceu a discrepância, mas não apresentou nenhuma recomendação e o governo não ofereceu nenhuma alternativa. As populações de origem engra, asiática e de outras minorias enfrentam um risco maior no caso de uma segunda vaga. Segundo o Guardian, os grupos minoritários estão representados nas mortes de Covid-19, correspondendo a 27% do total. São estes que estão mais sujeitos a contágio por não terem opção de ficar em isolamento ou sem trabalho.
Nas palavras da alta-comissária, “A luta contra essa pandemia não pode ser vencida se os governos se recusarem a reconhecer as flagrantes desigualdades que o vírus está a trazer à tona”. O acesso desigual a saúde e oportunidades econômicas por parte das minorias é um fator crucial nas altas taxas de doenças crônicas nessa população que, por sua vez, faz com que sejam mais vulneráveis aos efeitos da covid 19.