RUI TAVARES
O Reino Unido tem um tempo limitado — dois anos — para negociar a sua relação futura com a UE após a notificação de saída (o famoso artigo 50). Manda a lógica que se Theresa May quisesse estabelecer melhor a sua posição negociar junto do eleitorado britânico que o tivesse feito antes de o relógio começar a contar. Mas não é a lógica que manda nas opções do governo da Brexitânia: é a política. Depois de um ano em que foi atrasando a notificação para satisfazer as exigências de Farage e outros que querem a versão mais extrema de Brexit, Theresa May decide usar os primeiros meses em que deveria estar sentada à mesa das negociações para só agora perguntar ao povo o que deve negociar.
Imagino que a intenção seja ir para eleições dizendo que — face a um partido trabalhista em queda acentuada nas sondagens — o governo precisa de uma maioria maior ainda para ter mais força em Bruxelas. E depois seguramente eleita negociar o que quiser sem grandes constrangimentos. Mas o que Theresa May arrisca aqui é que os dois anos se esgotem sem acordo e que o Reino Unido se encontre sem qualquer tipo de transição fora da UE de um dia para outro em março de 2019. As consequências de uma saída desse género seriam imprevisíveis e refletir-se-Iam sobre todo o tipo de setores, da aviação à camionagem aos vistos para cidadãos europeus no Reino Unido e britânicos na UE. Não seria um hard Brexit nem um soft Brexit. Seria apenas um Brexit caótico. Os caprichos da política britânica indicam que essa não é uma hipótese que possa ser descartada.